sábado, 28 de fevereiro de 2009

Do berimbau baiano ao trombone francês






Dário Borim Jr.
dborim@umassd.edu

Pois é, mais um Carnaval se foi. O que nos resta agora é esperar pela Semana Santa. Que nada: isso é brincadeira de expatriado que (sobre) vive onde a festa de Momo é coisa de minoria étnica, e a Sexta-Feira da Paixão não tem bacalhoada no almoço, porque todos seguem suas rotinas nas escolas, campos e construções, só parafrasear o quase-esquecido Geraldo Vandré.

Quem me conhece de velhos tempos convividos ao sul da linha do equador sabe: o Darinho é como o tio Delmo e a prima Lília – ele adora Carnaval! Então, a cada ano, quando chega esse feriado, as circunstâncias me levam a repensar e reavaliar os motivos pelos quais não estou aí, não moro no Brasil, nem desfrutei mais que um único Carnaval tropical nos últimos nove anos.

A crônica de hoje, porém, não vai explicar minha opção de amarrar minha égua em curral estrangeiro. Sem nostalgia, de fato ela vai ecoar lembranças muito recentes, as deste Carnaval 2009, passado aqui mesmo, na costa sudeste do estado de Massachusetts.

Sei que muitos brasileiros não gostam de Carnaval, da mesma maneira que existem franceses que não bebem vinho e italianos que não comem pizza. Bem, para esses compatriotas, não tenho muito a dizer senão, “tudo bem, meus caros—assim sobra mais cachaça pra galera do samba e do maracatu”.

Então, sexta-feira chegou e o programa noturno não foi bater pernas pelos botecos da Praça Oswaldo Costa, digo, das ruas congeladas de South Dartmouth. A atração da noite era um espetáculo de dança moderna cuja coreografia é inspirada nos movimentos da capoeira e nas danças rituais do Candomblé e alguns estilos musicais brasileiros, como o samba, o afoxé e o baião.

A trupe, chamada Dance Brazil, apresenta-se em teatros de todo o mundo, mas é exclusivamente tupiniquim. Dirigida pelo carioca Jelon Vieira, conta com uns 20 bailarinos e bailarinas de Goiás, Minas, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo, além da Bahia, de onde vem a maioria desses fabulosos artistas-atletas, ou artesões dos ares. Eles são como corpos-aviões de borracha, ou espermatozóides de carne e osso. Com muita graça, restituem em nós, brasileiros, um enorme orgulho das nossas heranças culturais ao som de canções interpretadas, ao vivo, por quatro instrumentistas, com seus violões, berimbaus de vários tipos, e bumbos baianos do tamanho de uma lua cheia, com mais de um metro de diâmetro.

O Carnaval no exterior pode oferecer outras surpresas, como o Mardi Gras (Terça-Feira Gorda, em francês), de que pude aproveitar aqui mesmo, em Massachusetts. Dezenove anos atrás curti pela primeira vez essa tradição francesa, uma irmã do nosso Carnaval. Foi exatamente quando participei de um congresso de literatura numa universidade em Baton Rouge (vizinha da deliciosa, charmosa e matreira cidade costeira de Nova Orleãs, no estado sulista de Louisiana). Velhos tempos: eu dava minha primeira palestra acadêmica na vida e ganhava viagem de graça à terra do jazz. Naqueles dias de festa, que a todo ano coincidem com as datas da folia no Brasil, assisti aos desfiles de carros alegóricos lotados de bêbados e fantasiados pelas ruas Canal e Bourbon, pontos mais agitados da cidade.

Encontrava-me extasiado ao ver algo tão festivo e parecido com nossas tradições em terras tão distantes e destoantes do nosso país. Na época, informei-me dos grandes bailes de máscara realizados na cidade desde 1718. Outras novidades, entretanto, eram muito mais óbvias: o uso de carruagens puxadas a cavalos e apresentações de bandas escolares, militares e de bombeiros no meio da confusão. Havia também o antigo hábito, surgido em 1870, de se jogar colares coloridos das varandas dos sobrados coloniais rumo aos foliões que passavam dançando e bebericando rua abaixo.

Agora, em 2009, lá estava eu numa galeria de arte situada no coração histórico da cidade de New Bedford (a 15 minutos da minha casa, em South Dartmouth). Num ambiente um pouco estranho ao contexto “gélido” da Nova Inglaterra, normalmente enrustida e quieta em pleno rigor de inverno, dançávamos animados ao som de dixieland e ragtime. Estas são formas de jazz bem sincopado e salpicado de extravagâncias melódicas típicas de Nova Orleãs e nela imortalizadas pela prata da casa, o genial Louis Armstrong. No Mardi Gras de New Bedford uns 10 músicos locais tocavam trombone, saxofone, gaita, trompete, violão, alguns tambores e outras percussões. Interpretavam múltiplos estilos do Sul, como o blues, o cajun, e o zydeco, e outros ritmos alegres de origem afro-americana, francesa, caribenha, ou franco-canadense.

Com toda essa dança exuberante e energia musical, do berimbau baiano ao trombone francês, o coração de um paraguaçuense na terra do Tio Sam bateu em harmonia com os astros. Ficou em paz com o destino que lhe faz saudoso da terra natal, mas, do mesmo modo, admirador das alegrias e dos remelexos de outros carnavais.

16 comentários:

rose marinho prado disse...

Em porque viveu os carnavais de Paraguaçu, sabe extrair um caldo delicioso dessas vivências.

Deve ser muito bonito o carnaval que vinga aí na Nova Inglaterra. E além, o que os brasileiros desses grupos, de capoeiras e quetais, instauram noutros planos.

Não tem do que se queixar. A Praça Oswaldo Costa é você. O que vê agora passa por ela ( de preferência a antiga, com fonte de peixes vermelho-sangue).

Há quanto tempo está aí! Não pensei que fossem tanto anos!

djborim disse...

Obrigado pelo toque, Rose.
Minha historia de vai-e-vem, nessa linha sul-norte-sul, se iniciou em 1981. Ja' sao quase 28 anos, dos quais passei oito e meio no Brasil, desde que cheguei a este pais. Paraguacu e' minha ancora, e Minas e' meu acude. Meu barco, porem, e' do mundo, por forca da expressao. Com a devida humildade, ele e' de onde me sinto e me querem bem e, por isso, ali assento meus precarios acampamentos ate' a proxima jornada. Ja' morei em sete estados dos EUA, mas um so' do Brasil, o maior e mais gostoso pro meu coracao. Bjs, D.

Anônimo disse...

É isto aí, meu irmão.Pode estar certo de que o Carnaval, por onde vc passar, que seja na Pça Oswaldo Costa ou em outros rincões deste mundo, terá mais colorido e graça pq vc leva onde vai e dá um "grau" mesmo na alegria que rola. Muitos ainda virão, querido e serão mais e mais lembranãs boas!!!! Abração. Silvana

Anônimo disse...

Oi tudo bem? Fiquei muito feliz e surpresa, quando abri seu e-mail falando do carnaval e lembrando do meu pai e me colocando no meio . Obrigada E por falar em carnaval enviei umas fotos que a Dani tirou (incluindo o banho de espuma lá na praça , como eu tentei te explicar por telefone). Converçando com o Zé Codo no carnaval ele me disse que bateu saudosismos no seu pai durante o carnaval, que ele ficou horas falando , que até lembrou de namoradas . E que o ano que vem voce vira e que tomaremos todas na casa dele as 4 noites. Tá animado o tio. (Eu, claro, topo na hora e a turma agradece). Bom Darinho ate o proximo carnaval Beijos a todos Lilia

Anônimo disse...

É isso ái!! A vida é cheia de perdas e ganhos. E em cada escolha há uma perda incluída, não tem jeito. A arte é saber usufuir dos momentos gostosos e saber driblar as "pendengas" do dia a dia. Alegria sempre! Seja no carnaval ou em um dia tranquilo de domingo! Algumas pessoas são carnavalescas de coração e você é uma delas Brother, seja sempre assim, aonde você estiver.
Beijos da sobrinha Cacá.

Anônimo disse...

TERRIFIC!...Ganhei o domingo...Mil beijos. Risa.

djborim disse...

Caca'
Eh isso aih. Concordo plenamente com suas palavras, e espero manter esse espirito carnavalesco vida afora. Bjs.

Anônimo disse...

Risa,
Obrigado por ler a cronica do Carnaval.A familia vai bem?Vou te mandar umas fotos da galera de ca'. Beijos,Dario

Anônimo disse...

Que história linda... adorei a surpresa...

Adoro ver sua felicidade ! Ver como vc faz do limão limonada e toma com maior prazer...fazer desses lugares gelados um verãozão!

E aí? Com a nevasca deu pra ficar em casa com pijaminha de flanela botando as coisas em dia? Quando ce fala que tá nevando muito fico com um sentimento misto de achar que tá tudo lindo com a preocupação da sua segurança e da sua família... Sei que vcs tiram isso de letra,mas pra esses lados do sul do Equador é meio louco essas estradas de gelo... Falamos mais tarde ou amamhã.

Anônimo disse...

Que história linda... adorei a surpresa...

Adoro ver sua felicidade ! Ver como vc faz do limão limonada e toma com maior prazer...fazer desses lugares gelados um verãozão!

E aí? Com a nevasca deu pra ficar em casa com pijaminha de flanela botando as coisas em dia? Quando ce fala que tá nevando muito fico com um sentimento misto de achar que tá tudo lindo com a preocupação da sua segurança e da sua família... Sei que vcs tiram isso de letra,mas pra esses lados do sul do Equador é meio louco essas estradas de gelo...

BRAZILLIANCE disse...

Que legal Darinho!!!Gostei muito da sua cronica, claro que me identifiquei com tudo que vc menciona pois tbem sou uma fulia inveterada...e que baita saudade do Carnaval que deu!!!Ano que vem quero estar la em Pcu, sem falta...Abracao e GREAT JOB!!!

Anônimo disse...

Meu querido !!!!!!!!!!!!!
Muitas saudades !!!!!!!
Adorei a crônica !!!!!
Parabéns !!!!
Quem tem a arte nas veias e na alma, vai vivê-la em todas as suas manifestações !!!!!
Grande beijo,
Maria José

Anônimo disse...

Legal mano, ficou muito bom...
Liguei para casa agora e está tudo bem.
Se vc tiver o e-mail que o Tatau mandou, repasse para mim, nesse endereço.

Mano, não sei onde anotei o número de sua conta no banco do Brasil, mande novamente por favor.

Boa semana para vc. Pena que não deu para vc conversar com o Zé, ele estava chegando naquele momento.
Ligue outro dia.
Beijão.
Di

Anônimo disse...

Ótimo texto mano! Gostei muito.

Estou aqui em Muscat, em Oman. É muito parecido com o Bahrain, mas mais pobre.

É incrível a arquitetura da cidade, alguma coisa muito diferente em relação ao ocidente. A vegetação simplemente não existe, as montanhas são desnudadas totalmente.

Os arabes são muito diferentes, meio estranhos. Mas eles têm uma longa história e creio que estão mais civilizados que nós no Brasil. Basta ver a limpeza das ruas, a emissão de notas fiscais, a qualidade da comida, etc.

Creio que a visão estereotipada que os USA criaram para o oriente médio não condiz muito com a realidade aqui, pelo menos até onde pude conhecer.

Tem sido uma ótima experiência, com pub (imagine isto aqui) e/ou restaurante todos os dias, e serão 8! A cerveja custa US$ 4,80. Muito caro para o brasileiro.

Um grande abraço.

Unknown disse...

que bom encontrar o teu blógue, Dário. Tu não deves se lembrar de mim, mas eu me lembro de ti. :)

Abraços,

Anita

djborim disse...

Anita,
Obrigado pelo toque!!! Espero que vc curta ler algumas dessa cronicas de vez em quando. Ha' muitas no arquivo no lado direito do topo da pagina. E' um prazer enorme compartilhar.
Olha, lembro-me que nos encontramos em um congresso desses da vida, mas qual foi? Aquele na Yale? Como vc descobriu o blog?
Como e' que vc tem passado?
Se quiser trocar mais ideias, mande-me um email (dborim@umassd.edu).
Abracao,
Dario

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