quarta-feira, 29 de julho de 2009

O kaol é nosso

O kaol é nosso

Dário Borim Jr
dborim@umassd.edu


Quem diria que Paraguaçu também dá compositor, radialista e agente cultural de renome nacional? E quem diria que um de nós batizou o mais famoso PF (prato feito) de Belo Horizonte, o kaol? Quem me disse isso foi o Dr. José Côdo, meu caro cunhado, um amante de todas as coisas de Minas Gerais, mas principalmente as de Ubá, onde nasceu, de Belo Horizonte, seu segundo berço, e de Paraguaçu, pela qual também nutre especial afeição. Zé Côdo outro dia me falava todo entusiasmado desse tal de Rômulo Coimbra Tavares Paes (1918-1982), ou “o Lupicínio Rodrigues de Belo Horizonte”, como o chamava o compositor Gervásio Horta. Noventa e um anos atrás, Rômulo Paes não nascera na capital do Estado, mas, sim, na princesinha do Sul de Minas. Era então o dia da graça de 27 de julho de 1918.

Já passou da hora, pois, de sabermos todos que um paraguaçuense tem um monumento em sua homenagem em plena região nobre do centro de Belo Horizonte, exatamente na avenida Álvares Cabral junto à esquina com a rua da Bahia. Em minha mais recente viagem ao Brasil tive a oportunidade de visitar o monumento doado pela Usiminas à Prefeitura de Belo Horizonte em junho de 1995. Nele uma placa de bronze declara que, natural de Paraguaçu, Rômulo Paes “teve importante presença na vida cultural da cidade”.

Há poucas semanas homenageado em evento na Casa do Jornalista, Rômulo Paes representa um raro tipo de profissional, aquele ao mesmo tempo boêmio e empreendedor. Advogado, poeta, compositor, cantor, jornalista, radialista, produtor cultural, líder sindicalista, e também vereador da capital mineira, Paes fica na história como um grande freqüentador da noite belorizontina, especialmente das casas noturnas e cafés estabelecidos em eixos que atravessam o centro, desde o local do seu monumento até os bares da Lagoinha, e do Mercado Central até as imediações do bairro da Floresta. Durante aquela sessão solene foi lançado o disco Rômulo Paes e Coisas Mais, reunindo 14 canções de sua autoria interpretadas por vários músicos e cantores, inclusive Selma Carvalho, Helena Pena e o grupo Nós e Voz.

Na verdade as obras de Rômulo Paes, que incluem baião, foxtrot, marchinha, samba e toada, foram co-escritas por grandes nomes, como os de Adoniran Barbosa, Haroldo Lobo e Moreira da Silva, e gravadas por gente competente e famosa, como Dircinha Batista, Luiz Gonzaga e Orlando Silva. Tendo iniciado sua carreira de cantor de rádio em 1935, mais tarde Paes se tornaria diretor artístico da Rádio Guarani e diretor geral da Rádio Mineira, tendo lançado artistas de destaque, como Dalva de Oliveira. Alguns dos seus maiores sucessos, registrados na história da música popular brasileira, são as marchas “Já comi, já bebi”, “Galinha carijó”, e “Minha Belo Horizonte”, de 1957; e “Rua da Bahia,” lançada no Carnaval de 1962.

Paes ficou famoso por outro tipo de criação. Em reportagem publicada pelo jornal Estado de Minas (edição de 30 de maio, 2009, p. 20), Arnaldo Viana discorre sobre a história do famoso prato feito de Belo Horizonte, o “kaol”, iguaria lançada por um tradicional bar-restaurante, o Café Palhares, situado no número 638 da rua Tupinambás. Pois então, paraguaçuenses que moram ou visitam Belo Horizonte e que também queiram comer um kaol, como eu mesmo o fiz várias vezes lá pelos anos 70 e 80 afora: nosso conterrâneo está no centro desta criação culinária de 1950.

Assim narra Viana: “Sentado ao balcão, Rômulo Paes degustou o prato de arroz, ovo e lingüiça, que, para a maioria da freguesia, ganhava mais sabor se fosse precedido de uma pinguinha. […] E o poeta, compositor etc. etc. propôs ao João [Ferreira, dono-fundador do Café Palhares] batizar a singela iguaria: ‘Vamos lá: cachaça, arroz, ovo e lingüiça. Então vamos chamá-lo de kaol’, disse o multicultural Rômulo Paes. O ‘k’ entrou na pia batismal para dar certa nobreza ao prato, mas nem precisava. A nobreza, no caso, estava na simplicidade. E isso ninguém consegue explicar”.

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