Vamos todos torcer pelos Red Sox? Sei que alguns estarão reagindo assim: mas o que é isso, companheiro? Você não é brasileiro? Sou sim, mas também sou capaz de apreciar novidades (esporte, cinema, literatura, música ou dança, por exemplo) que fazem sentido, que me divertem e que me ensinam algo sobre a condição humana, sejam elas originárias da minha cultura ou das que venho descobrindo vida afora.
Beisebol não é futebol, claro. Não tem pedaladas do Robinho ou chapeus do Ronaldinho Gaúcho, mas, como o esporte das multidões globais, esse esporte norte-americano também tem sua beleza plástica e nos traz muita alegria e paixão. A maioria
dos estrangeiros que conheço aqui nos Estados Unidos pensa o mesmo: beisebol é muito chato, porque é muito lento e sem graça. Eu também pensava assim e, para ser sincero, levei aproximadamente 15 anos para mudar de ideia. Era pura ignorância. Até pouco tempo atrás, eu nem sabia que o pitcher (aquele que inicialmente arremessa a bola) não pertencia ao mesmo time que o batter (aquele que rebate a bola) em ação. A lentidão é apenas cíclica e resulta da enorme tensão psicológica em jogo. Além do mais, ela se desfaz em picos de ação cuja rapidez da bola é raramente comparável a de outros esportes.
No Brasil da minha infância e
adolescência, muita gente nem podia dizer com certeza qual era o tal de
beisebol: o jogo bruto dos americanos ou aquele outro, meio parado, com tacos.
Lembro-me que quando estava para me casar, no verão de 1991, meus futuros
parentes convidaram e pagaram para que minha família brasileira fosse ver um
jogo dos Twins, na belíssima arena chamada Metrodome, em Minneapolis. Também
era minha primeira chance de ver um jogo de beisebol profissional. Embora eu já
tivesse acumulado quase cinco anos de vida nos Estados Unidos, naquele estádio
eu me sentia quase tão estrangeiro quanto os meus pais, irmãs e primos que
tinham chegado de Minas há poucos dias.
Embora eu tivesse tido a oportunidade de me aproximar lentamente do esporte nos
anos seguintes (e isso aconteceu porque descobri a alegria descompromissada, a
descontração geral, e todo o “folclore” que se pratica nos estádios de ligas
profissionais menores, como a dos Pawsocket, em Rhode Island), foi-me
necessário ver meus filhos jogar beisebol nos campos do parque Crapo, em
Dartmouth, para que eu de fato aprendesse as principais regras e as múltiplas
sutilezas desse fabuloso esporte.
Quando tento racionalizar sobre os aspectos do beisebol que o tornam tão
apelativo às massas, concluo que é seu incrível equilíbrio entre
responsabilidades individuais e coletivas. O pitcher vive uma
guerra pessoal contra o batter, um duelo que às vezes me faz pensar
na relação tensa e terrível entre o touro e o toureiro. O aspecto psicológico
daquele desafio entre os jogadores, porém, é de múltiplas conseqüências. Um
desses dois elementos poderá levar sua equipe e seus fãs ao deleite total, à
glória de um grand-slam, por exemplo, ou à humilhação de uma
derrota de 12 a 2, como a que aconteceu aos Indians, de Cleveland, semana
passada. Entretanto, o resultado de uma partida de beisebol poderá depender
muito bem da rapidíssima sincronia de arremessos entre os jogadores do in-field e out-field,
ou ainda da fantástica captura de uma bola rebatida pelo batter,
cuja eficácia terá impacto direto no resultado final.
Depois de vários anos chegou o momento de me dar conta do meu profundo respeito por beisebol – mais que um esporte, uma instituição dos Estados Unidos que não precisa da aprovação do resto do mundo para se manter viva e apaixonante. A comprovação final dessa afinidade com o beisebol veio depois de assistir a duas recentes partidas no lendário Fenway Park, em Boston. Aquilo é misto de competição pacífica e festa de bom humor. Pessoas que não se conhecem se falam, fazem piadas, e, às vezes, até se abraçam. Entre milhares de fãs há uma constante vibração e zumbido. Quase sempre o clima é de celebração, ao som de rock and roll ou algum canto de glória em ritmo pop-rock. Acima de tudo, naqueles momentos me valeu a impressão de quão importante é conhecer para só depois julgar quem quer que seja ou qualquer coisa que nos retire do falso conforto de nossas convicções sobre mundos alheios.