Debra Mann Quartet em Noite de Tom Jobim
Sinergia das Artes
Dário Borim Jr.
Que privilégio conviver
numa comunidade onde conhecemos muita gente criativa, onde podemos nos sentir
imersos num circuito das artes, literatura, e meios de comunicação de massa! Há
certos dias em que parece que a energia positiva que passamos e recebemos uns
dos outros atinge graus mais elevados. A sensação de companheirismo e
co-autoria do nosso viver através das artes
se torna mais nítida, mais envolvente, mais inspiradora. Ontem, dia 10 de abril,
de 2014, foi assim.
Meu
ponto de partida é a edição de ontem do Brazilliance,
meu programa semanal de rádio e internet, sempre das 16h00 às 19h00 (h. de
Brasília). Encontrava-me, então, mais solto e descontraído que nas três semanas
anteriores, quando recebi no estúdio da WUMD (a emissora universitária onde
produzo meu show há 12 anos e meio) nada menos que 14 alunos de três escolas
secundárias da região. Eles aprenderam um pouco sobre o mundo da comunicação e
sobre a música brasileira. Leram e ouviram de mim sobre 14 dos nossos estilos
musicais. Eles fizeram uma provinha em que tinham que descobrir qual gênero
musical eu tocava ao vivo na rádio. Três deles conseguiram acertar 13 das 14 perguntas!
Para mim era um prazer especial oferecer instrução e divertimento musicais a
esses jovens membros da comunidade onde moro. É claro que não é fácil educar e
entreter 14 adolescentes assentados no carpete de um pequeno estúdio, mas, pelo
menos para mim, valeu a pena.
Ontem,
porém, éramos só eu e Deus, no estúdio, e muita gente querida no outro lado da
comunicação, os ouvintes (meus conhecidos ou não) que se espalham por esta
região costeira da Nova Inglaterra, e por outras partes dos Estados Unidos,
Europa e América Latina. Um daqueles ouvintes, o Juan, me chamou ao telefone.
Tinha gostado de uma canção que eu tocara há minutos. Ele conhecia a cantora/pianista,
Debra Mann, que interpretara “Água de Beber”, de Tom Jobim e Vinicius de
Moraes. Juan queria saber, gentilmente, se eu tinha interesse em entrevistá-la
ao vivo no programa, pois ela era sua amiga. Qual foi a sua surpresa quando eu
lhe disse que a conhecera pessoalmente duas semanas atrás, quando ela se
apresentou com mais três músicos na International House of Rhode Island, uma
bela escola de inglês para estrangeiros em Providence, onde, no mesmo evento, e
com muita honra, fiz uma minipalestra sobre Tom Jobim logo antes do concerto. O
repertório do quarteto, aliás, foi inteiramente dedicado à obra do Maestro
Soberano, uma apresentação musical de jazz, samba, e bossa nova fenomenal, com
a ilustre participação de Mike Turk, um gaitista de primeira ordem. Vale dizer
que aquela noite de domingo teve muito mais, inclusive uma bela feijoada completa,
regrada a caipirinha que não era só para gringo ver: era mesmo da boa!
A
conversa que tive com Juan ao telefone foi o início de uma fantástica sequência
de encontros e desdobramentos artísticos. Após o show, dirige-me ao centro
histórico de New Bedford, para a edição mensal do que chamam de Aha Night,
noite de eventos culturais realizados na segunda quinta-feira de cada mês. No Green
Beans, um café, prestigiei o trabalho de Andrew, filho de meu amigo polonês,
Yurek. Ele expunha fotografias obtidas em Amsterdã e na terra de seu pai.
Minutos depois, caminhei até o Museu de
Arte de New Bedford com três amigos, Don (escultor e cineasta), Leila
(fotógrafa e jornalista), e Beatriz (escultora e fotógrafa). Lá fui apresentado a um amigo
de Beatriz, o David, que reconheceu o meu nome e minha voz por ele há muitos
anos ser ouvinte do Brazilliance.
Esse simpático professor de matemática (e inveterado viajante do mundo inteiro)
fez uma festa pela chance de poder conversar cara a cara com o seu “favorito
DJ”. Eu ri, é claro, porque, tenho a sensação de que sou DJ somente quando
estou na rádio. Fora dela, “tiro a máscara”, e sou de novo apenas o Darinho.
Não me acostumo com o status de celebridade regional da mídia… hahaha!
A noite
teria muito mais a nos oferecer. Ainda no Museu de Arte de New Bedford, apreciamos
as fantásticas esculturas em madeira de dois artistas locais, Ron Rudnicki e Leah
Woods, para depois seguirmos a pé rumo ao Cork, um restaurante de menu espanhol
(mas que oferece ótimas caipinhas). Lá se uniu a nós outro amigo de Beatriz, o Owen,
que nos narrou o enredo de um impressionante script que ele escreveu para um filme alguns anos atrás. Enquanto o vinho descia, subia nosso entusiasmo pelas ideias
e experiências artísticas e literárias de cada um. Don, por exemplo, dava-nos
mais detalhes técnicos da filmagem de um curta-metragem que está concluindo
nessas próximas duas semanas.
Owen
explicava seu estranho, perigoso e ilegal método de aprender o português.
Descobre canções brasileiras no YouTube, copia as letras e as imprime em papel,
para depois colar a folha no painel do carro. Enquanto dirige na estrada,
escuta uma Marisa Monte ou um Gilberto Gil e ao mesmo tempo passa os olhos nas
lestras. Assim desenvolve seu vocabulário, ainda sem multa ou acidente. A um
certo momento Owen perguntou ao grupo se todos por acaso ouviam um programa de
rádio local sensacional, que tocava muito samba e bossa nova. Ele quase caiu de
costas quando soube que ali falava com o próprio DJ daquele programa.
Beatriz,
por seu turno, dava detalhes da trama de um script
que está escrevendo no momento para uma peça de teatro. Ela já me conhece
há uns dois anos quase, mas depois ouvir-me contar alguns “causos”, confessou que
estava muito interessada em adicionar ao filme um personagem “parecido” comigo,
com o meu jeito animado e criativo de falar de música e fotografia, de contar
histórias e defender ideias numa mesa de bar.
Nada
como conviver com a alegria, a sinergia, e a imaginação aquecidas ao
sabor do vinho e da amizade. Rimos -- e rimos muito -- daquilo tudo que se
disse sobre nossas vidas e nossas artes, e também das asneiras que me vieram à
mente -- por exemplo, o fato de que “tchim-tchim”, como brindamos no Brasil, é
o nome para a genitália masculina em japonês. Também gostaram da anedota em que
Darinho, aos 22 anos, gastou do seu espanhol ao perguntar a um
centro-americano, “Le gusta la pinga?” O hermano
teve dúvidas sobre as minhas intenções. Mal sabia eu que “pinga” naquela parte
do planeta também é o nome para aquele mesmo famoso órgão masculino.