Fins de semana podem ser de vários tipos. Alguns nos reservam enormes novidades. Outros são tão desanimadores que nos fazem questionar a própria validade desses dias que passamos distantes do local de trabalho. É verdade que com a internet (ou mesmo há muitos anos antes dela), podemos levar os afazeres profissionais para casa. Principalmente nós, professores, lutamos com a separação emocional entre labor e prazer em frente a uma tela de computador.
Para mim, há muito mais vida nos fins de semana do que nos demais dias. Apesar disso, desde que haja de fato tempo e oportunidade para as novidades, não me importo de trabalhar um pouco aos sábados e domingos. Em alguns dos meus fins de semana atípicos, as novidades inexistem ou se escondem. Talvez o que me falte, então, seja apenas o devido entusiasmo para buscá-las.
Em outros fins de semana, de repente chega-me uma abundância de possibilidades de entretenimento. Esse foi o caso da semana passada (13-15 de novembro), em que Gal Costa se apresentou no belo teatro Zeiterion, situado a menos de 15 minutos da minha casa. E que maravilha de apresentação acústica foi aquela numa prazerosa noite de sexta-feira, em meio a um outono de temperaturas bastante amenas!
A adorável sexagenária baiana, ícone de meus sonhos nos anos 70 e 80 (alguns deles sapecosos), cantou e sorriu ao lado de um exímio (e simpático) violonista brasileiro radicado em Nova Iorque há quase 20 anos, Romero Lubambo. Os dois artistas, alegres e bem-dispostos, conversavam entre si e com o público sem a menor inibição, entre canções que passeavam do samba de raiz à bossa nova e à MPB, sem deixar ninguém imune aos irresistíveis charmes de Ary Barroso, Chico Buarque, Tom Jobim, Noel Rosa, Caetano Veloso e outros gênios tupiniquins.
Em certo momento, eu que me encontrava ao lado de um dos meus melhores amigos, o filósofo Rick Hogan, sussurrei que a interpretação que acabávamos de ouvir de “Dindi”, uma pérola musical de Tom Jobim, era, e continuaria a ser até o fim do show, a mais graciosa canção daquele variado repertório. Logo eu reconheceria, entretanto, que errara, pois ao retornarem ao palco para cantar dois temas após ouvirem um retumbante “mais um”, Gal e Romero fascinaram a platéia com algo ainda mais formoso e encantador que “Dindi”. Era a vez de “Lindeza”, tema de Caetano Veloso originalmente lançado no seu disco Circuladô (1991).
Ao sairmos do teatro, voltei a sussurrar ao ouvido de meu amigo: “Riquinho, essa última foi ainda mais especial, não? E como se a beleza dessa canção por si mesma não fosse suficiente para me ‘derrubar’ emocionalmente e me fazer chorar um pouquinho, ela simplesmente foi a primeira canção que toquei no primeiro programa de rádio que fiz na vida, oito anos atrás”. (O aniversário do Brazilliance, aliás, é dia 4 de dezembro, e recordações de velhos shows me estão garantidas para os próximos dias!)
Como havia ainda mais um motivo para me ter emocionado ao final daquele show, novamente abordei meu amigo, o ouvinte mais fiel que Brazilliance já teve até hoje: “Tem mais, companheiro. Aquela música do Caetano se fez inseparável de uma velha história de amor que jamais vou esquecer”. Rick apenas sorriu. Sabia de quem se tratava. Também sabia que seu amigo era um dos últimos românticos, como ele próprio. Além de concordar com aquela avaliação de “Lindeza”, Rick não quis dizer mais nada senão algo assim, em bom português, “Ai, Darinho... você e suas paixões!”
Certas experiências pessoais, inclusive as paixões, podem se esticar por meses, anos ou até mesmo décadas afora, mas alguns fins de semana são tão interessantes, tão “longos” e recheados de novidades, que a gente se esquece que eles vão se acabar, e que teremos que voltar à rotina. O espaço desta crônica é limitado, como também é limitado o tempo entre uma sexta-feira e a segunda que nos empurra de volta à mesmice.
Por isso não terei meios para discorrer sobre a festa de degustação de vinhos da qual participei numa charmosa galeria de arte, logo na noite seguinte àquela do show da Gal. Tampouco poderei contar do fenomenal espetáculo que Milton Nascimento (o de Três Pontas), acompanhado de excelente banda, deu-nos no domingo em Boston (sim, naquele mesmo fim de semana), com direito a “Coração de estudante”, “Canção da América” e “Para Lennon e McCartney”.
Termino, pois, com alguns versos de “Lindeza”, que na voz de Gal Costa comoveram centenas de almas, fazendo história, numa sexta-feira-dia-treze, dia de muita sorte em New Bedford, Massachusetts: “Coisa linda/ É mais que uma idéia louca/ Ver-te ao alcance da boca/ Eu nem posso acreditar/ Coisa linda/ Minha humanidade cresce/ Quando o mundo te oferece/ E enfim te dás, tens lugar/ Promessa de felicidade/ Festa da vontade/ Nítido farol, sinal/ Novo sob o sol/ Vida mais real/ Coisa linda/ Lua lua lua lua”.
16 comentários:
Ai Darinho, "Coisa Linda" demais! Vc é romantico de verdade! E escritor de maravilha. Parabens! R.
Oi, Riquinho--
Que bom que vc gostou da cronica. Nos compartilhamos uns momentos magicos naqueles tres dias--alias, muitas noites nos dois ja aproveitamos pra valer, nao e' meu amigo? So' que, em particular, jamais vou me esquecer daquela noite de sexta-feira. Foi demais pro meu coracao brasileiro e mineiro!
Darinho
Valeu Darinho,
Boa semana pra vc.
Nós continuamos nossa aventura no Vale do Jequitinhonha até a semana que vem!!
Um abraço
Nélida
Eii!!É muito gostoso ler as suas crônicas e perceber a sua paixão pela vida, pela música e por tantas outras cosias mais!! O dia a dia suga a nossa energia e, por isso, mesmo cansados, nos finais de semana a gente tem que fazer um esforço para aproveitar cada momento da vida. É isso aí!! Beijinhos Cacá.
Ei brother,
Adoro ver você assim nos seu entusiasmo e admiração compensando os momentos cinzas dos stresses inevitáveis, ainda bem que você vibra com alegria e carinho. Lindeza! Bjo Nina
Ei brother,
Adoro ver você assim nos seu entusiasmo e admiração compensando os momentos cinzas dos stresses inevitáveis, ainda bem que você vibra com alegria e carinho. Lindeza! Bjo Nina
Darinho-- nada como escrever sob uma emoção. É muito melhor, muito bom o texto, valeu. Também estou sob a emoção de haver realizado um sonho desde que formei.
Cooordenei um evento nos dias 20 e 21 de novembro chamado: "O Médico, o Sonho e o (Des) Encanto"
Foi muito bom e todos os envolvidos, palestrantes e ouvintes, realmente se emocionaram. Foram temas do dia a dia médico que não são falados e discutidos nem nas Faculdades e nem nos Eventos. Participaram médicos com 47 anos de formados, por ex., e acadêmicos.
Valeu.
Abraços
Zé
Adorei a cronica. Ela encanta por contar com tanta graça a ansiedade da espera dos finais de semana. Vc começa gostoso, comentando como é bom ter esses dias pra se fazer o que se quer, e se são bons ou ruins depende de nossa pré-disposição.
O relato do show da Gal é uma história a parte, e realmente escuta-la cantando "Dindi" já é bom no Brazilliance, imagino o deleite de ser ao
vivo, acústico e ainda mais por aí, em plena Nova Inglaterra! Deve ter sido
um presente! Fechar com Milton no domingo então, dispensa comentários.
Nem preciso dizer que conhecer "Lindeza" pra mim também foi um momento que será inesquecível. E ter a letra fechando a cronica do mes de novembro foi uma sessão remember sem fim. Aproveitei e procurei uma reproduçào com a Gal
e sai cantando pela casa, enquanto me arrumava pra dormir, feliz feliz... XXX
Dario,
Já antecipo o prazer que vai ser ouvir a emissão do aniversário do Brazilliance! Sua crônica, me fez bater mais fundo e forte o coração: sentimento inexplicável esse que envolve o sujeito quando ele escuta a sua língua, a sua música, em terras estrangeiras... Emoção que não se escreve, mas que você escreveu e com competência, alegria, elegância, força e energia. Uau! Foi como se tivéssesmos acompanhado você(s) em flash back. Delícia...! Que venham outras!
Abraço
Boa Darinho. Que rico fim-de-semana e que saboroso quando as paixões se recordam em musica! Temos que pensar ja' em comemorar o dia 4 de Dezembro-oito anos não é brincadeira.
Um beijo
D:
Recebi, li logo e adorei. Como nao fui ao espectaculo, fiquei ai com a sua narrativa-lindeza!
Obrigada.
lisa g
...bom D+... um abraco, Risa.
Gostei. Ja que e's chair agora, dificil viajares, certo?
Pensei q pudesses ca vir e falar sobre MP e romance XIX e =m minha aula.
Outro pobrema: com que verba eu vou?
Sigo pensando.
Primo, vc escreve que é uma "coisa linda"... Adorei, pra variar!! Vc é demais!! Que delícia é ler suas crônicas. Me fazem bem, sabia!!
Beijos
Já li e adorei!
"Darinho e suas paixões..."
beijo e boa quarta-feira
:)
:-) Adorei a cronica tambem, viu?!? So nao parei para escrever um recadinho , mas amei....
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