quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Labuta ou Lazer?


Minha carreira profissional se mistura a minha sede de lazer. Faz muito tempo que isso ocorre — desde 1982, quando troquei de roupa, de chapéu, ou melhor, me re-encarnei mesmo, sem ter morrido. Romanticamente abalado até o osso e decepcionado com a falsa ciência de se construir rápido e barato (mas cobrar caro), eu simplesmente me despi de uma fantasia: uma carreira na engenharia civil. Logo após o Carnaval daquele ano, imitei Che Guevara sem motocicleta. Juntei meus trapos e meus livros do Fernando Gabeira para logo encarar uma longa estrada pela América do Sul rumo à América do Norte. Atravessei por terra e ar sete países em quatro semanas. Depois tive que experimentar os primeiros sabores de três outros cursos universitários (psicologia, geografia e pedagogia) em três diferentes escolas americanas, até que a ficha caísse. Acabei virando outra pessoa quando percebi que tinha certa vocação para as letras.

Passaram-se muitos anos, mas na labuta ou no lazer, continuo me ocupando com palavras. Há um ano e meio assumi um difícil compromisso junto à Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos: ler 62 livros e escrever umas “coisinhas” para publicarem num livro bianual daquela instituição, a maior biblioteca do mundo. Estou frito, pois o prazo está acabando exatamente daqui a uma semana e ainda tenho três volumes a dissecar, além de um ensaio a redigir, e nem sei quantas sinopses a concluir para o mesmo projeto. Todos os livros são coletâneas de crônicas brasileiras, quase todos deliciosos de ler — entre eles um de nosso querido conterrâneo Jeferson de Andrade. Num só volume há 101 delas. Oh Gerarda, diria eu num agitado barzinho de Belo Horizonte, se por lá estivesse, neste momento, e não aqui, nesta madrugada cinzenta e úmida de Massachusetts.

Então me veio uma dúvida cruel: nas próximas horas devo ler mais uma dúzia de crônicas de Mário de Andrade ou escrever minha própria crônica para A Voz da Cidade? Labuta ou lazer? Quem sabe consigo fazer as duas coisas, com uma pequena ajuda dos meus leitores que vão aqui comentar minha crônica anterior, “Belos Horizontes”. Sem o saber — e sem querer me processar por plágio, espero — vocês estarão contribuindo, mesmo que anônimos e em forma de palimpsesto, para mais uma edição desta coluna. Vamos lá!

Ficou muito boa! Belo Horizonte agradece. Sou mineira de coração. A próxima vez que tu ficares perdido em Atlanta, chama a gente! A crônica ficou maravilhosa! Sabe que quando você termina a crônica dizendo do nosso privilégio de ficar aos pés da serra do Curral me vieram três coisas na cabeça, esse luar maravilhoso visto por lá, o Parque das Mangabeiras e o Parque Municipal. Sei que existem milhões de outros atrativos nesta grande cidade pra você escrever, mas é que estes três lugares são Darinho pra mim. Agradeci a Deus por ser belo-horizontina depois desse encerramento! Com o coração cheio de esperança que tudo ainda vai melhorar e dar certo pra mim! Ficou maravilhoso o texto, como sempre!

Eta trem bom..., nem me fala que delícia é a sua terra! Gostei! Como sempre um texto apaixonado e muuuito bonito. Para mim, Belo Horizonte é tudo o que diz o título. Acho a cidade muito bonita e foi um presente conhecê-la em uma viagem a Minas Gerais que também passeou pelos arredores dos Horizontes. É claro que, diante de tantas coisas lindas que foram ditas, ainda cabe ressaltar — porque indiretamente você trouxe o tema — a presença grandiosa dos autores que se relacionam aos horizontes belos e às gerais de maneira contínua. A cultura transborda e a gente aproveita!

Não é que o texto ficou bom demais, sô! Uai, mas você não se esqueceu de nada! Muito bom seu texto. Mais uma vez, a sua "mineiridade" transparece azul e leve, entre suas palavras. Uma crônica de "peso"! Passeei pelas localidades que você descreve, sonhei com as intuições e maravilhei-me com seu estilo... sem redundância... personalíssimo!

Legal e muito bem escrita. Ficou linda... Concordo com tudo, que paisagem linda e... que belo encerramento de seu trabalho! Nós e BH adoramos receber você aqui. E viva o céu de Belo Horizonte! Muito poética e inspirada. Apaixonante! Pude até ver este "céu-mar" cristalino e o grupo de dança Corpo (que adoro) dando o seu show lá na terrinha! O seu pai já havia me ligado e falado sobre esta sua nova cria! Ele gostou muito e falou todo empolgado sobre a mesma. Valeu, Dário. O legal é "ver" Belo Horizonte através dos seus olhos, que, compreensivelmente, são bem mais românticos do que os nossos que vivem aqui. Um abração e boa semana.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Belos Horizontes



Depois de 34 horas de viagem, cheguei a Belo Horizonte à uma da manhã de sábado, dia 26 de junho. Era para ter batido à porta da casa de minha irmã Silvinha e cunhado José Côdo no dia anterior, onze horas antes. Os tempos mudaram. Com os aviões sempre cheios e as companhias aéreas cada vez mais falidas (por que será?), não se viaja mais sabendo ao certo quando ou como chegar a nosso destino. Desta vez estava para sair de Boston e deveria seguir até Nova Iorque e de lá partir para São Paulo, rumo a Belo Horizonte. Ao invés de fazer esse itinerário, minha rota foi vítima de tempestades de granizo que caíram na capital de Massachusetts e na Grande Maçã. Estas me empurraram para Atlanta, onde perdi uma conexão para São Paulo. Fui parar em Santiago, no Chile. Depois de vislumbrar os maravilhosos Andes cobertos de neve, me aborreci, no aeroporto, ao ver a péssima partida de futebol que fizeram Brasil e Portugal. Terminei a jornada ileso, e é isso que importa.
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Naquela noite, meus simpáticos e generosos anfitriões ainda estavam de pé e me aguardavam com uma bela sopa de feijão preparada pela Maria, talentosa cozinheira que trabalha aqui nesta casa há várias décadas. A conversa logo se fez animada e se estendeu até as três horas da madrugada. Nosso assunto principal era a cidade de Belo Horizonte, sobre a qual me incumbi de escrever um texto acadêmico para um livro a ser publicado na Suécia. Não sei se darei conta do recado, mas com certeza me vi em boa posição para iniciar a pesquisa ao trocar idéias àquelas estranhas horas. É que meu cunhado é um amante e profundo conhecedor da história dessa cidade, minha segunda cidade do coração, perdendo apenas para Paraguaçu, é claro.
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No desenrolar de nosso colóquio sobre a capital levantei a questão principal para a elaboração do meu ensaio: como é que uma cidade como Belo Horizonte se posiciona culturalmente diante de duas megalópoles, São Paulo e Rio de Janeiro? A capital de Minas Gerais, nós concordamos à mesa, não se anula sob o poder das duas cidades que dominam não apenas a região Sudeste, mas todo o país. Muito pelo contrário, Belo Horizonte não deixa de se afirmar como um pólo cultural de alcance regional, nacional e internacional, apesar de estar geograficamente tão próxima daqueles poderosos centros.
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Temos aqui uma cidade para onde convergem artistas de todo o estado e de vários países. Entre tantos outros nomes de expressão, destaca-se o Clube da Esquina, formado por músicos da estirpe de Milton Nascimento, Toninho Horta, Lô Borges e Beto Guedes. Sem falar no grupo Uakti, ícone global de excelência musical, por tradição e inovação: das composições clássicas ao folclore do Vale do Jequetinhonha e à vanguarda ainda sem rótulo. Entre nós se encontra, também, o berço do grupo de dança moderna Corpo e o do grupo de teatro Galpão, ambos com altíssima reputação mundo afora. Enquanto isso, o Instituto Inhotim continua sendo o maior museu de arte contemporânea a céu aberto do mundo, e a cidade realiza, anualmente em julho e agosto, o seu enorme Festival Internacional de Teatro, acompanhado de pelo menos dois festivais de jazz de alto calibre.
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Uma das conclusões a que chegamos sobre as origens dessa força cultural é a de que a Terra do Pão de Queijo só poderia ser assim porque é a capital de um estado gigantesco com uma identidade distinta, ao mesmo tempo variada e coesa. Pode-se viajar mais de 830 km a partir do centro do estado, onde está a cidade inaugurada em 1897, e ainda se permanecer dentro de Minas Gerais. A começar pelo seu gosto por sofisticado artesanato, renomada culinária, e todo um etos de “mineiridade” imortalizado por seus escritores e contadores de “causos”, a terceira maior região urbana do país, planejada no final do século XIX ao redor da antiga vila Curral del-Rei, é “uma roça que deu certo”, segundo Cristina, uma amiga belo-horizontina. Ao nosso redor reúnem-se as múltiplas, fascinantes e peculiares características das regiões que a circundam geograficamente. Há quem diga, aliás, que o perfil étnico de Minas torna esse estado uma espécie de microcosmo do Brasil, e talvez seja por isso que produtos culturais como discos, filmes e espetáculos musicais sejam primeiro testados e lançados em Belo Horizonte.
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Minha estadia nesta cidade me tem oferecido várias oportunidades para discutir todas essas questões com familiares, amigos, motoristas de táxi e outras pessoas que se interessaram pelo tema. O melhor mesmo, porém, é ter tempo para desfrutar da beleza dos seus horizontes tão belos em incansáveis caminhadas pelas ruas e ruelas do Parque Municipal, da região da Savassi e dos bairros Mangabeiras e Serra. Isso sem contar o frescor e o balanço das noites de chopadas e baladas em vários de seus milhares de bares, cafés, e danceterias, do Armazém do Árabe, à Obra e ao Paco Pigalle.
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É fácil dizermos e sentirmos que amamos essa cidade, e que não nos faltam motivos para muito orgulho, a todos nós mineiros, de qualquer canto do estado, mas principalmente a nós que temos a sorte de ver a lua nascer atrás da serra do Curral e regozijar sob as estrelas, sob nossa parcela do mar de Minas, aquele que para Rubem Alves, não é no mar. Portanto, o mar de Belo Horizonte é mesmo no céu. É um mar para o mundo “olhar pra cima e navegar sem nunca ter um porto pra chegar”.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Copas do Mundo


Minha irmã Silvana, uma das duas psicólogas da família, me diz que ela e eu temos uma característica em comum: um “eu comunitário”. Já ouviram falar? A gente sente pelos outros, às vezes até antes deles próprios. Somos esponjinhas dos sentimentos alheios e, por extensão, dos sentimentos das massas, que podem ser bem mais que “90 milhões em ação, salve a seleção”. Parece incrível, mas a população do Brasil dobrou desde a Copa do Mundo de 1970. Essa a primeira a que assisti, por já ter idade, quase 11 anos, e por ter sido ela a primeira Copa do Minha irmã Silvana, uma das duas psicólogas da família, me diz que ela e eu temos uma característica em comum: um “eu comunitário”. Já ouviram falar? A gente sente pelos outros, às até antes deles próprios. Somos esponjinhas dos sentimentos alheios e, por extensão, dos sentimentos das massas, que podem ser bem mais que “90 milhões em ação” do grito musical de “salve a seleção” lançado em 1970. Parece incrível, mas a população do Brasil mais que dobrou desde a Copa do Mundo daquele ano, no México. Aquela copa foi  a primeira a que assisti, por já ter mais idade para compreender o drama nacional naqueles eventos (quase 11 anos), e por ter sido ela a primeira Copa do Mundo mostrada pela TV brasileira em tempo real! Nesses últimos quarenta anos, incluindo o sucesso tupiniquim em junho de 1970, vencemos três das dez Copas do Mundo que entraram para a história. Agora, na África do Sul, repte-se o drama: queremos a todo custo ser novamente campeões.

Não vi nenhuma estatística a respeito, por isso não sei qual é a parcela da humanidade que tem essa característica de personalidade, o tal “eu comunitário”. Não importa! Vocês todos que estão lendo esta crônica devem ter algo parecido, se por acaso ficam arrepiados ao ouvir o hino nacional na hora do jogo. Ou se sentem vontade de abraçar e pular com estranhos na hora de um gol do Brasil. O fato é que, para quem tem um “eu comunitário” e também para quem não o tem, as Copas do Mundo separam épocas das nossas vidas e fincam profundas marcas tanto nas nossas mentes individuais como nas nossas lembranças familiares, comunitárias, nacionais ou mesmo transnacionais.


Daquela minha primeira Copa pela TV, por exemplo, ficou a lembrança de dois tios. Um deles, Dagoberto Pereira, me fez entender como que as emoções de um jogo podem ser pesadas demais para certas pessoas. Ele ficava caminhando nas ruas do quarteirão em volta da nossa casa. A cada dez minutos voltava e perguntava o placar de Brasil x Inglaterra. Outro também muito querido e muito fanático por futebol (e pelo Corinthians em particular) era tio Delmo, quem, na época, tinha um braço e o peito engessados. Sofrera um sério acidente de carro poucos dias antes dos jogos. Apesar do seu sangue italiano, ele dizia, com convicção, a todos reunidos na Praça Oswaldo Costa (onde uma TV exibia os jogos em branco-e-preto): “o Brasil vai ganhar da Itália de 4 a 1”. Poucos acreditaram nele, mas a previsão do tio Delmo acertou em cheio. Com Pelé, Jairzinho, Tostão, Rivelino, Gerson, Clodoaldo, Carlos Alberto (quase só tinha craque aquele time), o Brasil daquele ano massacrou a squadra azzurra e deixou muitas saudades.


Para mim, individualmente, também foi inesquecível um determinado momento de outra Copa do Mundo, a de 1982, na Espanha. Era a primeira copa que eu assistiria no exterior. Os dormitórios da Universidade Estadual de Mankato, em Minnesota, tinham poucas TVs a cabo, e nenhum dos canais disponíveis mostraria os primeiros jogos do Brasil. Angustiado, tive que apelar para o rádio, onde talvez eu conseguisse ouvir uma transmissão em ondas curtas (com certeza nada de futebol haveria em AM ou FM). Pouco antes da hora marcada para o início da partida do Brasil contra a Austrália, precisaria de sorte para achar uma rádio que transmitisse o jogo direto da Europa, eu consegui, mas em espanhol. Pensei: melhor isso do que nada. O coração já estava um pouco apaziguado depois da frustração que sentira ao saber que não haveria transmissão por TV, quando me veio a idéia de apanhar meu rádio portátil e toca-fitas marca Sony (ver foto acima) e levá-lo para fora do prédio onde eu morava no campus: quem sabe o chiado diminuiria.


Foi obra do Anjo da Guarda, ou minha estrela-guia, como diz minha mãe. Jamais esquecerei o trovão de alegria que me atingiu no momento em que encostei a antena do rádio na parede externa do dormitório e religuei o aparelho. As primeiras palavras que ouvi me comveram: “Sob o patrocínio do seu Conhaque de São João da Barra, passamos a falar diretamente da Espanha.” Que maravilha! Eu mal podia acreditar, mas agora passava a ouvir a Rádio Nacional do Rio de Janeiro, em bom, dulcíssimo português brasileiro. Os gringos que jogavam voleibol nas imediações do dormitório logo acharam que havia um louco entre eles naquele campus, porque só mesmo um maluco ficaria tão ligado e tão próximo a um aparelho de rádio, nele colando o ouvido e, de vez quando, dele se soltando, aos berros, em puro êxtase! Afinal, naquele 23 de junho o Brasil derrotou a Austrália por 4 a 0 no Estádio Benito Villmarín, em Sevilha.


Pois é, aquele foi apenas o começo de uma longa série de recordações associadas ao campeonatos mundiais de futebol, que a cada quatro anos vêm sedimentar nossos laços coletivos e aguçar nossas emoções mais exaltadas de gozo e sofrimento, aflição e contentamento! Espero voltar ao assunto em breve. Não faltarão “causos” futebolistas para outras crônicas. Ao encerrar por hoje, vale repensar como é bom ser brasileiro nesses anos mágicos que ressurgem ciclicamente, momentos em que fãs de todo o mundo reconhecem e temem nosso talento, nossa criatividade, e nossa forma alegre de jogar. Enquanto isso nós, os únicos participantes de todas as Copas do Mundo, vamos sempre sonhar e chora atrás de mais um caneco de ouro.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

domingo, 23 de maio de 2010

Fé e amor no que se faz



Quem trabalha com arte tem seus privilégios. São muitas as maneiras de que podemos unir vida e criação, lembranças e emoções. Podemos levar nosso carinho às pessoas a quem amamos (e muitas vezes a quem sequer conhecemos), compartilhando, por exemplo, uma bela e comovente melodia, ou aquele poema atilado e justo para descrever o que nos parece inexplicável. É assim, pois, que enquanto programador e apresentador de rádio, eu tenho o prazer de dedicar canções.

Ocasionalmente reservo uma parcela de meu programa para oferecê-la a alguém em forma de tributo. Esse foi o caso de três semanas atrás, dia 29 de abril. A data era significativa. Precisamente 75 anos antes, portanto, em 29 de abril de 1935, um jovem de 12 anos caminhava bem vestido pela rua Aureliano Prado, em Paraguaçu, Minas Gerais. Uma jovem, que se recostava a uma janela de sua casa, viu aquele menino de terninho branco e estranhou-lhe o traje:
— Onde você vai assim tão bem vestido, Darinho?

O menino respondeu logo:
— Vou trabalhar pela primeira vez na vida. Hoje é meu primeiro dia lá na Casa Oriente, na loja do Sr. Luiz Almeida Prado.

Entusiasmado, aquele futuro “caixeirinho” ouviu doces palavras que o seguiriam para o resto da vida:
— Vai com Deus, Darinho. Eu aqui vou rezar um Ave-Maria para que você tenha muita sorte no trabalho e na vida!

Aquele Darinho deixou de ser Darinho alguns anos depois. Apesar disso, até hoje acontece de eu estar visitando os meus pais e atender ao telefone quando alguém me pergunta pelo Darinho (mas não sou eu). Aquele Darinho teve muita sorte, sim, além de muita visão comercial, muita garra e muita perseverança. Nasceu em um lar de parcos recursos materiais, tanto é que somente usava sapatos aos fins de semana antes de conseguir aquele primeiro emprego. Teve pouca escolaridade, mas mesmo assim foi capaz de “vencer na vida” como homem de família, empresário e líder comunitário.

Aquela edição do Brazilliance, meu programa de rádio, caiu exatamente no dia 29 de abril. Eu não poderia deixar por menos. Tratei de reunir discos que tivessem pelo menos algumas das “clássicas” canções que meu pai mais gostava de cantar ao longo dos anos em que nos reuníamos em volta do piano de minha irmã Silvana. O tributo começou com o disco Omaggio a Frederico e Giulietta, uma gravação ao vivo em San Marino, região não muito distante de onde veio parte da nossa família italiana, os Borins. Com sua suave voz Caetano Veloso interpreta “Ave-Maria” (composição de Erothides de Campos): “Cai a tarde tristonha e serena, em macio e suave langor / Despertando no meu coração a saudade do primeiro amor! / Um gemido se esvai lá no espaço, nesta hora de lenta agonia / Quando o sino saudoso murmura badaladas da ‘Ave-Maria'!”

Na seqüência veio o disco de Renato Motha e Patrícia Lobato, Antigas Cantigas. Entre tantas pérolas, escolhi “Bodas de prata” (Mário Rossi e Roberto Martins) e “Eu sonhei que tu estavas tão linda” (Lamartine Babo e Francisco Mattoso), cujos versos assim se fecham: “Violinos enchiam o ar de emoções / E de desejos uma centena de corações / Pra despertar teu ciúme, tentei flertar alguém / Mas tu não flertaste ninguém! / Olhavas só para mim / Vitórias de amor cantei / Mas foi tudo um sonho... acordei!”

As três canções que iniciaram a homenagem a Dário Borim também são algumas das prediletas de minha tia Vilia, irmã de meu pai, que costumava acompanhá-lo nas cantorias lá em casa. Houve ainda tempo para outra música bem conhecida e estimada pela geração de meus pais e tios, “Chão de Estrelas” (Sílvio Caldas e Orestes Barbosa). Para tocá-la consegui nada menos que uma versão ao vivo de um de seus compositores, o renomado Sílvio Caldas. Para encerrar, vieram lembranças dos inúmeros carnavais do Ideal Clube, onde meu pai, enquanto presidente daquela associação por 17 anos, teve que permanecer sóbrio para lidar com os exagerados do álcool e do lança-perfume. Era a vez, então, de um clássico de Noel Rosa e Heitor dos Prazeres, “Um Pierrot apaixonado”, na voz de Maria Bethania.

Poucas horas após o final daquela edição especial do Brazilliance pude falar com meu pai ao telefone. Ele agradecia a homenagem e também me contava, com seu contagiante alento, que naquele dia tivera tempo para visitar a jovem que lhe desejara boa sorte em 29 de abril de 1935. Em plena consciência, a sra. Otília Gonçalves o recebeu em casa, fazendo tricô. Ela, na casa dos 90, e ele, bem perto de lá, confirmavam sutilmente a noção de que a vida pode ser longa e compensatória para quem tem fé e amor no que faz.

domingo, 11 de abril de 2010

Esses avoados Borins



Dário Borim Jr.
dborim@umassd.edu
Batista, Alex, Geraldo, Henrique, DB, Tatau e Delson -- Turma da Eterna Saideira
Hoje não tem papo de Clarice Lispector nem Machado de Assis. Meu irmão, o Tatau, já me falou que gosta mesmo é das minhas crônicas sem muito laralará intelectual. Quem sabe esta sai do jeito que engenheiro gosta. Vou falar de gente que passa apertado de vez em quando simplesmente porque tem o perigoso hábito de fazer uma coisa pensando “profundamente” em outra(s). Não ajuda, é claro, quando o indivíduo passa por uma fase de muito estresse, muito trabalho e reduzidas horas de sono. Eu sou um desses “infelizes”. Aliás, dizem que é um problema de família, os Borins. Não quero julgar e condenar em público a lerdeza dos meus irmãos ou colocar a culpa nos nossos progenitores. Porém, não nego o boato: “alguns desses Borins são muito avoados!”
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Pra ser mais justo, acho que é sensato dizer que todas as pessoas têm os seus momentos de lerdeza, não é? Às vezes as anedotas não passam de invenções das más línguas. Por isso não sei se é verdade, mas já ouvi falar, por exemplo, algo sobre uma de minhas irmãs (não digo o nome para protegê-la da mentira que pode haver por trás desse “causo”). Ela partiu e chegou ao aeroporto de Confins com dinheiro e documentos, sim, mas tinha deixado em casa a única mala que deveria levar consigo.

É mole? Claro que não. Mas vocês ainda não viram nada. E como essa crônica ainda não apareceu publicada em jornal, vale tudo por aqui, até a interação de leitores e leitoras. Duas delas acabaram fazendo comentários que merecem intromissão intertextual numa narrativa que já está ficando muito pós-moderna para o meu gosto. A questão é que depois de ler a versão inicial deste texto, crônica que gerou 25 comentários publicados online em dois dias, minha irmã Silvinha me mandou um email querendo saber da tal irmã que foi para o aeroporto sem mala:

— Quem será? Ainda bem que não fui eu, porque EU fui a Lavras, de carro, só que esqueci a mala em BH. Ela, a mala, chegou de ônibus. Normal. É só uma questão de logística, como diz o mano Joseph [o vulgo Tatau].

Normal? Isso não é nem o único engenheiro entre nós. Por exemplo, Tatau achava, na época da ditadura militar, que muitas placas que víamos nas estradas indicavam a existência de mais uma companhia estatal, a EM-OBRAS. Uau! Por alguns anos ele se referia à avenida Álvares Cabral, no centro de BH, como se fosse avenida “A Cabral”, questionando quem era essa moça famosa, porque a placa dizia apenas “Av. A. Cabral”. Será que o ponto estava apagado? Fazia diferença para o engenheiro?

Que normalidade é essa da nossa família se anteontem chegou uma mensagem eletrônica da minha afilhada Cristina, filha da avoada que “viajou” sem mala para dar aulas na Universidade Federal de Lavras. E eles em Lavras aceitam professora de BH sem mala? Preparem-se, meus caros, porque isso que diz a Cristina não é ficção mineira não, como suspeitou com humor o distinto crítico literário e poeta Charles Perrone, através de uma recente mensagem publicada no FaceBook. Minha sobrinha não se segura:

— Hihiii, mas temos casos demais para contar! Tem aquela do vovô que foi consultar em Alfenas, mas a consulta era em Varginha. Tem a minha: eu estava aguardando minha hora num consultório de acupuntura quando deveria mesmo ter ido a um consultório de gastroenterologia!

Vejam que a própria sobrinha não escapa da carga genética que atravessa gerações. Houve época em que ela freqüentava assiduamente a casa dos meus pais em Paraguaçu, por isso pode contar mais dois causos que a maioria da família ainda ignora:

— A vovó chamou a polícia por causa de um barulho muito alto de música que chegava no seu quarto de dormir. Na verdade o som vinha do rádio-relógio dela! Essa agora para mim é uma das melhores. O funcionário da loja do vovô, Afonso, teve que ir à casa do vovô às pressas para desligar o micro-ondas, porque programaram a máquina para 4 horas de ação e ninguém na casa sabia como desligar! Eh... Borinzada danada!

Eu digo tudo isso sobre minha família antes de confessar: eu provavelmente sou o pior de todos. Vamos viajar cronologicamente, então, e visualizar este cronista em dois de seus momentos de maior apuro ou embaraço. O primeiro foi lá pelo ano da graça de 1985. Eu ensinava num cursinho de inglês de Belo Horizonte, o MAI, e, infelizmente para aquele jovem de 26 anos, tinha que dar aulas aos sábados de manhã. Certa vez eu saí de casa atrasado, mas, como morava na av. Francisco Salles, podia chegar ao trabalho, usando meu Chevette marrom, numa questão de quatro ou cinco minutos.
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Nesse tal dia pulei logo da cama quando percebi que tinha perdido a hora. A culpa certamente era da falsa “saideira”, a boêmia e inocente garrafa de cerveja que era logo seguida de outra “saideira” e, depois, muitas outras, consumidas sob o mesmo rótulo de “saideira”. Na Casa do Kibe, a “metragem” de garrafas em linha sobre a mesa crescia quase ad infinitum, até que já era tarde demais para quem tinha que trabalhar cedo no dia seguinte.

Quando, naquela nefasta manhã, eu passava em frente ao Colégio Arnaldo, senti que o motor do carro perdia força rapidamente. De fato, veio a morrer em questão de segundos. O bom é que o sinal estava verde e passei por ele no embalo — podendo, graças a Deus, chegar ao MAI, na av. Brasil, naquele mesmo sopro de cilindros em seca, também de ressaca! Eu tinha me esquecido de pôr gasolina, é claro, e agora o tanque me dava dor de cabeça, pois tinha “desidratado”. O santo foi forte, não é, e me empurrou até meu destino. Só que meu santo se esqueceu de me avisar: bobagem pentear o cabelo ou escovar os dentes se não dava tempo, mas era preciso ter trocado de roupa, uai! Quando eu entrava no prédio foi que me dei conta: ainda estava de pijamas.

Passaram-se 25 anos e o “desligado” sr. Dário Borim Jr teve lá seus outros problemas, mas o espaço aqui é curto. Então, pulemos no escorregador do tempo até a quinta-feira passada. Eu tinha que devolver à Central de Polícia da Universidade de Massachusetts Dartmouth a chave da WUMD, estação de rádio onde faço o Brazilliance, meu programa semanal de música luso-brasileira. O colega radialista David Nader, apresentador do show Mediterranean Café, que vinha logo depois do meu, estava na Espanha. A entrega da chave era coisa muito importante e fora da minha rotina, por isso representava um risco para um homem “desligado”. Para eu não ir para casa sem antes deixar a chave na policia, fiquei com a dita-cuja na mão esquerda o tempo todo. Essa era minha estratégia para um desmiolado não dar vexame!

Cheguei bonitinho ao meu carro, um velho Kia Sephia verde, com a chave da rádio na mão, e logo me dirigi para onde deveria. Quando eu estacionava em frente ao prédio da policia, passou no seu carro um técnico de futebol, Gene Bergerson, meu amigo. Ele parou por um instante e perguntou sobre o meu filho Ian. Fiquei pensando no menino por uns instantes e conversando com o Gene. Enquanto isso eu fechava a porta do meu carro sem perceber que, daquele jeito, eu estava trancando a danadinha. Ainda agi como desligado mais uma vez, trancando em seguida a porta de trás do motorista.

Caminhei até a polícia, e somente quando voltei foi que vi que tinha trancado o carro inteiro, mas a chave continuava na ignição e, o motor, ligado! Minutos mais tarde o policial de plantão me informou que não podia me ajudar. Era contra o regulamento! Então liguei para o serviço AAA, de auxilio a motoristas. Chegariam em 30 minutos, por se tratar de um caso de emergência: “motor ligado!” Senão, levariam 50 minutos para aparecer! Huh! Não fiquei contente, e vi que uma janela estava com dois cm de abertura. Fui para o lote da polícia, sem qualquer permissão dos bacanas. Procurei e achei um tubo metálico de 2 metros e tal, que talvez desse para abrir a tranca da porta do outro lado do carro. Mas que diabo, eu não conseguia finalizar o “arrombamento” do meu próprio carro porque o tubo era pesado e chegava a menos de um centímetro da tranca, sem poder movê-la.

Bem, aí vi uns cinco rapazes alegres caminhando em minha direção. Com toda a humildade contei-lhes meu “causo” de homem avoado e pedi-lhes ajuda. Minha falta de orgulho-próprio foi recompensada. Um deles tinha os dedos mais fortes que os meus e conseguiu levar o tubo mais a frente um pouquinho e abrir a tranca. Lição final: com jeitinho e santo forte, não há cabeça avoada sem proteção. Bem, eu já ia esquecendo. (Estou sempre esquecendo algo!) Cuidado: tem nó que nem pai de santo desata. Por exemplo, é melhor tirar os pijamas antes de ir trabalhar.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Sopros de vida

Sopros de vida 

Mais um fim de mês vem chegando. Uma amiga de Belo Horizonte, leitora assídua deste blog, já me havia escrito um email reclamando mais uma crônica. Escritor vive disso – não é? – da impressão de fazer alguma diferença na vida de alguém. Podemos não chegar a tanto, mas sonhamos com a pequena importância que pode ter o nosso gesto criativo, nossas horas de reflexão e diálogo conosco mesmos, que desejamos estender a todos que por eles se interessem – tanto o leitor conhecido quanto o desconhecido, o real ou aquele apenas sonhado. 

Enquanto questiono qual tema devo, aqui, abordar, um livro não me sai da cabeça: Why This World, de Benjamin Moser. Lançado para o mundo de língua inglesa pela Oxford UP, a obra foi traduzida para o português por José Geraldo Couto e publicada no Brasil pela Cosac Naify com um título que inclui uma vírgula matreira, Clarice,. Esse maravilhoso misto de biografia e análise literária anda mesmo presente no meu cotidiano desde o momento em que o apanhei na estante de uma livraria em Providence, Rhode Island. 

É sobre algo em torno desse livro que hoje quero refletir, embora não me sinta plenamente preparado. É que receio que não se possa falar bem, no espaço de uma crônica, de uma vasta e questionadora obra como aquela, de uma vida tão interessante e chocante como a de Clarice Lispector, de uma ficção tão complexa e intrigante como a que ela nos deixou ao falecer aos 57 anos de idade, e muito menos da brilhante análise e exposição que Moser faz das relações entre a arte de vanguarda genial e o drama pessoal de uma artista imortal. Aceito, entretanto, o desafio de instigar a imaginação do leitor com alusões à experiência surpreendente que foi me aproximar da mente e da criação de uma das escritoras que mais me fascinam. 

Não há como escolher o ponto certo para o início dessa jornada que me proponho. As referências de Moser ao primeiro romance de Clarice, Perto do coração selvagem, por exemplo, me surgem quase aleatoriamente. Fazem-me recordar que essa também foi a primeira obra que li da romancista judia que imigrou da Ucrânia para o Brasil antes de completar um ano de idade. Em 1942, ano anterior ao seu casamento com o diplomata Maury Gurgel Valente, seu colega de faculdade de direito, a escritora de apenas 21 anos elaborava naquele romance um profundo questionamento das possíveis dificuldades da vida matrimonial: a perda da privacidade, o peso da cumplicidade, a restrição da liberdade, e, talvez, ainda mais atemorizante, a definição de um destino certo, previsível, e acético para a mulher, principalmente se esse destino era o de exemplar esposa do lar. O casamento da autora duraria 16 anos. Quando o ex-marido lhe escreveu uma carta buscando reconciliação, utilizou-se exatamente das duas protagonistas de Perto do coração selvagem, Joana e Lídia, para expressar sua forma de ver o comportamento da autora/ex-esposa, uma mulher claramente atormentada pelo medo de amar, por depressão, e por uma desesperadora saudade do Brasil, país que nunca lhe saía da mente, onde quer que fosse – Itália, Suíça, ou Estados Unidos. 

As relações entre a vida e a arte dos artistas são assuntos que há anos me fazem ponderar o preço da fama. Nos últimos 12 meses minhas dúvidas se avolumaram ao ler sobre Vinicius de Moraes, Gibran Kahlil Gibran, D. H. Lawrence, Machado de Assis e Graham Greene, entre outros. O que me parece especialmente revelador e inusitado no caso de Clarice Lispector é que a autora pareceu viver uma vida em que a própria experiência empírica continha fortíssimos elementos da ficção que ela ia criando ao longo de três décadas. Era como se a escrita determinasse os caminhos da autora pelo mundo afora, desde o primeiro romance até os dois últimos. Em um destes, a pseudo-autora/narradora quer morrer, como ela própria, Clarice, parece ter desejado também, apesar do sucesso financeiro das vendas e o valor simbólico da glória no seu último ano de vida, 1977. Aquele novo momento de luz – repetindo a celebridade efêmera que lhe chegara após o lançamento do romance de estréia, 33 anos antes — talvez a fizesse se sentir um tanto redimida da ansiedade e da frustração acumuladas em longos períodos de sua carreira profissional. 
 
Ao final da vida Clarice Lispector havia desenvolvido grande cinismo diante do poder da própria literatura. Pensava que com ela, com a sua obra, não salvaria ninguém. Na melhor das hipóteses, poderia salvar a si mesma. Ela escrevia por sentir necessidade visceral de fazê-lo, forma irrecusável e insubstituível de se sustentar emocionalmente. Quando já não mais podia contar com o salário do marido, depois da separação, em 1959, a literatura também passou a constituir seu único ganha-pão, profissão esta que, em certa medida, desejou abandonar. Em Um sopro de vida há uma personagem-escritora cansada de escrever e de viver. Por isso desejava fazer com que uma de suas personagens, Ângela Pralini, morresse de câncer. Pois, assim, a vida da autora, Clarice Lispector, seguiu a arte da autora dentro da arte. Clarice posteriormente contraiu um câncer nos ovários, como se eles estivessem secos, como os de Macabéa, a protagonista de A hora da estrela (uma nordestina, como ela própria se sentia, por ter nascido e vivido até os 15 anos no Recife). 

Uma das lições de vida que me passa a obra de Moser (e a literatura de Clarice Lispector, naturalmente) é que nos tornamos muito vulneráveis ao colocar toda a nossa fortuna, por maior ou menor que seja ela, numa ficha só. Assim aconteceu ao protagonista de Scott Fitzgerald, no seu festejado romance O grande Gatsby, para quem o amor desenfreado por Daisy o separou do real e do plausível. Quando apostamos tudo o que temos numa única fonte de seiva, tal como uma determinada pessoa ou uma determinada ocupação, e esse sopro de vida absoluto se esvai, o vazio poderá não nos deixar crer em outra razão de viver. Viver, assim, sem razão, é um inóspito sofrer, é meio caminho à morte. Paradoxal como sua própria obra, Clarice trilhou esse meio caminho, mas resistiu como pôde à outra metade. Até as últimas horas de sua sofrida existência, quando já se encontrava sedada, ela não parou de escrever, ditando suas últimas palavras a Olga Borelli, uma fã de sua literatura que se tornou sua amiga, editora, governanta e, praticamente, figura-de-mãe-adotiva. 

Era como se Clarice Lispector agora escrevesse as últimas linhas de seu último romance, o romance de toda uma vida. Depois de uma severa hemorragia, ela sabia do seu iminente fim naquela na manhã de nove de dezembro. Levantou-se da cama, quis fugir do hospital e, irritando-se com a enfermeira que a tentava deter ali mesmo, derramou sua cólera: “Você matou minha personagem” (Moser 383). Esse longo e belo relato da existência e legado da maior estrela da literatura brasileira do século XX se encerra, apropriadamente, evocando as palavras do jornalista Paulo Francis: “Ela se tornou sua própria ficção” (Moser 383).

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