quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Gestos de amor


Era 18 de dezembro, 2004mais uma noite fria de quase inverno, como se as datas no calendário valessem a autoridade que assumem ao determinar o começo e o fim das estações.  Sete anos depois (hoje é dia 20 de dezembro), aqui mesmo em Dartmouth, na costa sul de Massachusetts, relembro a história por detrás de um livro que acaba de sair nos Estados Unidos. É a tradução que fiz para o idioma inglês da biografia escrita por Helena Jobim: Antonio Carlos Jobim: An Illuminated Man.
Para muita gente, essa época do ano é basicamente de alegria por conta da antecipação mental que se faz dos dias em que a família estará reunida, em clima de harmonia e descontração. Para outras pessoas, na melhor das hipóteses esse é um tempo de desassossego. Teme-se o que há de vir: ou a solidão, ou o desentendimento entre familiares, ou mesmo a saudade de quem está ausente ou já partiu desse mundo. Para quem mora longe e não pode estar com seus queridos, por exemplo, o desconforto desta estação de festas pode ser pungente. Fatores climáticos exacerbam a dor ainda mais. Pode ser a chuva incessante que anda caindo no sul e sudeste do Brasil, o tom cinza predominante na paisagem ou o frio rigoroso que, por aqui, com neve ou sem neve, é acompanhado de uma escuridão deprimente a encobrir as ruas e os campos até mesmo antes das quatro horas da tarde.
Naquele dia 18 eu pensava em meu saudoso amigo Roberto Reis, professor e orientador no doutorado que eu fazia na Universidade de Minnesota. Ele morrera também 10 anos antes, em 1994, apenas duas semanas após o falecimento de Tom Jobim. Foi, então, que escrevi uma resenha, em inglês, do livro de Helena Jobim, que até a data só tinha edições em português e japonês. A vida e a morte de Jobim narradas em linguagem poética e dramática pediam-me uma reação, a expressão da minha própria dor que crescia a cada minuto porque se unia àquela de uma irmã desolada pela morte do adorado irmão, cuja música era venerada nos quatro cantos do mundo, mas, principalmente, cuja ausência lhe resfriava a alma de tal maneira que a empurrava à beira do paroxismo, um abismo emocional.
Três anos e meio mais tarde, eu passava férias em Paraguaçu. Certo dia, precisamente a 16 de junho de 2008, eu lia meus emails numa lan-house perto da Praça Oswaldo Costa, quando me deparei com uma mensagem enviada por alguém que não pertencia ao meu círculo de amigos. Eu estava pronto para enviá-la ao lixo cibernético quando decidi verificar do que se tratava: "Dear Sir, I read your 2005 review of Helena Jobim's memoir, and found it fascinating. My research finds no English-translated edition. If you know of one, would you be so kind as to direct me to that source? Sincerely, Robert Lamm." Era um email que, ao mesmo tempo, elogiava minha resenha da edição brasileira do livro de Helena Jobim e me perguntava se eu sabia da existência de uma tradução inglesa daquela obra.
Bastante lisonjeado, respondi imediatamente.  Também estava levemente frustrado por não poder ajudar com a indicação de uma versão do texto para o idioma em que o meu leitor também pudesse ler a biografia poética e apaixonada de Tom Jobim. Logo após mandar o meu email, resolvi fazer uma pesquisa na internet a respeito do meu leitor. Que surpresa me esperava! Logo descobri que Robert Lamm era o pianista, vocalista e fundador do Chicago, banda que nós (bem comportados) ouvíamos em nossas festas dançantes em Paraguaçu, e (bem menos comportados) curtíamos nas nossas repúblicas em Belo Horizonte.
Aquela surpresa seria apenas o início de uma série de desencadeamentos. Através da mesma mágica pós-moderna da internet eu sei que, no horário de Brasília, Robert me escreveu de Cincinnatti, Ohio, às 16h28. Li seu email e, sem muita demora, o respondi às 18h50 (ainda sem saber ao certo quem era Robert Lamm). Sugeri a leitura de uma crônica sobre Tom Jobim que eu havia publicado na revista Brazzil, de Los Angeles, em inglês. Também já revelava naquele email o meu interesse em traduzir o livro de Helena. 
Às 20h26 eu escreveria um segundo email a Robert Lamm, antes mesmo de receber sua resposta ao meu primeiro, dizendo-lhe que Chicago tinha sido uma das nossas bandas favoritas nos anos 70. Ainda naquele dia 16 Robert me responderia às 23h51, com múltiplas informações sobre suas ligações com a bossa nova, sua amizade e parcerias com Marcos Valle, e sua disposição para me ajudar a fazer e publicar a desejada tradução, que se transformou em belo e elegante livro de 300 páginas, 80 fotografias, lançado pela maior editora de partituras do mundo, a Hal Leonard. Está agora à venda em todo o mundo por meio de dezenas de livrarias virtuais, inclusive esta, sediada em Londres, que oferece o livro por apenas 22 dólares, sem cobrar frete nacional ou internacional: www.bookdepository.com.
Robert Lamm e eu mantivemos assíduo contato nas próximas semanas. Ele e seu grupo Chicago faziam uma tourné mundial. Por isso hoje eu recebia um email dele, vindo Tóquio, amanhã, de Copenhague, dois dias depois, de Londres, e assim por diante. Robert obteve o número de telefone de Helena e sugeriu-me editoras. Até mesmo doou dinheiro à Universidade de Massachusetts Dartmouth para que eu oferecesse um curso a menos no outono de 2008 e, portanto, me ocupasse com a tradução da obra a partir de setembro. Nesse mesmo mês tive a felicidade de conhecer e jantar, na casa de minha irmã Silvinha e cunhado José Codo, com Helena Jobim e seu marido, Manoel Malaguti, homem muito simpático e entusiasmado com o projeto de tradução. Infelizmente ele viria a falecer pouco mais de um ano depois daquela memorável noite em Belo Horizonte.
Devo concluir que pude realizar um sonho a partir da generosidade de um grande músico e de uma simples resenha em forma de tributo a um gênio da música universal. Era também a catarse de uma tristeza multifacetada: os falecimentos de Roberto Reis e Tom Jobim, além da melancolia de inverno e fim de ano. Entre outras lições, aprendi que quando se diz ou se realiza algo por afeição e em busca de paz de espírito, cria-se um efeito cascata. As águas poderão rolar ad infinitum, e nunca se saberá até onde poderão chegar as consequências de um gesto de bem, de ternura, e de amor.

sábado, 10 de dezembro de 2011

Antonio Carlos Jobim: An Illuminated Man







Antonio Carlos Jobim: An Illuminated Man

(by Helena Jobim, published by Hal Leonard, 2011)

Translator's Note

Dário Borim Jr.
University of Massachusetts Dartmouth and WUMD

WHILE LISTENING TO ANTHOLOGICAL RENDITIONS of bossa nova classics by Ella Fitzgerald, Stan Getz, João Gilberto, Dizzy Gillespie, Oscar Peterson, and Sarah Vaughan, among others, I read Helena Jobim’s elegant
Portuguese prose about the genesis of true gems of twentieth-century music. After every other minute, I was further enthused to re-create, in English, such fascinating story lines that explained the writing of “Dindi,” “Desafinado,” or “The Girl from Ipanema.” Moments of such sensorial and intellectual bliss had been extremely rare in my life as writer, literary critic, translator, and radio producer.

It was not always an easy spell, though. Antonio Carlos Jobim was someone else who knew all too well the perils and powers of translation. He always sought the most competent professionals in the business, such as lyricists Ray Gilbert, Norman Gimbel, and Gene Lees, to make his songs shine in meaning and elegance in the English language. He, himself, worked diligently on several of the new versions proposed for his lyrics.He understood the lights and shadows, especially the cultural and linguistic aspects, of literary translation, which demands cuts and additions, welcomes similarities and differences, but cannot refrain from gains and losses. As a result, many stanzas of “Águas de março” and “Waters of March,” for example, are not the same. Although they differ considerably even in length, the two poems display much more in common than the literal images they convey. Most significantly,
neither is superior to the other.

Translating this book has been as daunting as any other translation task, except for the fact that Helena Jobim is an award-winning writer and her brother is regarded by many critics as one of the greatest composers of the twentieth century. So, I definitely gave my heart and soul to this mission, but not without the support from the University of Massachusetts Dartmouth and several individuals. My thanks go to John Cerullo, for trusting this project, plus Iris Bass, Jessica Burr, Mike Edison, and all other Hal Leonard staff who have helped make this volume what it is visually and otherwise. For various acts of kindness and expertise I am indebted to Helena Jobim herself, her husband, Manoel Malaguti (in memoriam), Marco Feitosa, Thereza Otero Hermanny, Ana Lontra Jobim, and Cristina Rocha, in Brazil; and Ann Fifield, Kassandra Hartford, Maureen Hall, Rick Hogan, Janet Homer, Christopher Larkosh, and Charles Perrone, here in the United States.  Most of all, I am grateful for the generosity and inspiration from pianist and singersongwriter Robert Lamm, one of the founding members of the legendary  group Chicago.

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